terça-feira, 1 de março de 2011

Comunicação via humanização: Um risco ou uma necessidade?

Sempre fui um pouco cética no que diz respeito às reflexões amplamente teóricas que não me pareciam aplicáveis à realidade organizacional. Até que tive a oportunidade de conhecer as reflexões críticas sobre comunicação e humanização nas organizações de Dennis Mumby, um dos mais respeitados estudiosos e pesquisadores da Comunicação Organizacional no mundo.

Em sua teoria crítica, o autor abre perspectivas sobre como a comunicação via humanização estabelece um diálogo entre os interlocutores que dinamiza as relações, por meio da interatividade, possibilitando espaço para deliberação e negociação entre os agentes da comunicação e assegurando que sentidos seja construídos em conjunto.

Este conceito de comunicação que, na minha visão, está ainda na teoria e não permeou a prática, desestabilizaria as práticas de poder e resistência por parte das organizações. Explico: quando conceitos são divulgados, numa abordagem da alta direção às demais camadas da organização, por meio da comunicação interna, significados são construídos a partir de relações de poder e de perspectivas concebidas pelas lideranças. As mensagens disseminadas pela comunicação organizacional têm sua origem neste contexto e refletem a ambição das corporações de fazer com que os funcionários internalizem a visão de mundo e estratégia da organização.

Assumimos, então, que a comunicação via humanização, por sua vez, está orientada para uma abordagem relacional, onde buscamos um diálogo não “por que nos simpatizamos uns com os outros, mas por que damos atenção às diferenças que desafiam nossa compreensão do senso comum de como o mundo funciona”. A partir dessa premissa, compartilho da visão do autor sobre o quanto essas interações colaborativas desafiam as posições de poder vigente possibilitando que “aquilo que é dado como certo seja reformulado à luz das diferenças entre os interlocutores”.

Partindo para um contexto mais específico, proponho a seguinte reflexão: será que não é o risco de desestabilizar o “status quo” que incomoda as organizações quando do uso das mídias sociais na comunicação interna? A dinâmica do uso das mídias sociais propõe uma comunicação essencialmente humanizada, pois é instável, incerta, reproduzida a partir do discurso de seus membros e, por isso, fragilizaria o poder nas organizações na medida em que permite:

a)      acesso ao poder de decisão: possibilidade de falar e ser ouvido em tempo real
b)      poder para influenciar pessoas, processos e seus resultados
c)      acesso à informação e análise adequada de seu conteúdo (lembrando que, para muitos, informação ainda é poder...)
d)     intensifica o processo aberto de deliberação e tomada de decisão

E será que não é isso que as organizações precisam e, ao mesmo tempo, temem? A possibilidade de deliberação e diálogo já se reflete em outras instâncias da vida do funcionário, na medida em que ele pode exercer sua influência como cidadão e consumidor, por exemplo. Por que não em seu ambiente de trabalho?

Será que não é pertinente que as organizações percebam seus funcionários como seres complexos que podem contribuir, colaborar, deliberar sem que isso represente uma ameaça ao que é vigente?

Para complementar, gosto da ideia que o autor apresenta de estabelecer, em linha com estes desafios, uma comunicação compassiva: notar, sentir, responder. Ou seja, se abrir ao que acontece ao seu redor, reconhecer as necessidades dos funcionários e agir a fim de fomentar a reciprocidade.

Na era da deliberação e diálogo aberto como a que vivenciamos, já não é possível moldar a ideia das pessoas em linha com a realidade organizacional. Os funcionários têm experiências e relacionamentos únicos e próprios que não são necessariamente permeados e/ou mediados pela lógica corporativa. E ao se comunicar de forma deliberativa e relacional, as organizações têm a oportunidade ímpar de “considerar o outro não como alguém que precisa ser incorporado à sua visão de mundo, mas sim como alguém diferente”.

Alguém que “apresenta um horizonte de possibilidades diferente do nosso e que representa um risco para nós, por que se engajar ao seu horizonte nos abre a possibilidade de mudança e transformação”.

Mudança e transformação. Não é disso que precisamos?!

MUMBY, Denis. Reflexões críticas sobre comunicação nas organizações. In: Kunsch (org). A comunicação como fator de humanização das organizações. São Paulo: Difusão, 2010, p. 19 – 39.

Um comentário:

  1. O Mumby é sensacional. Ele fez palestra aqui em São Paulo em 2009 e foi muito bom. Há uma entrevista com ele numa edição da excelente Revista Organicom. Veja mais em https://sites.google.com/site/arevistaorganicom/

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