segunda-feira, 16 de maio de 2011

Comunicação Interna: área-mensageira na gestão de mudanças internas

Trabalho na mesma empresa já há algum tempo. Desde o meu primeiro ano lá, essa companhia vive um processo de mudanças internas intensas e ininterruptas. Elas são desencadeadas por fatores diversos: mudanças nos modelos de negócios, necessidade de melhorias na excelência operacional, programas de crescimento acelerado, regionalização das operações, etc.

É claro que os objetivos que geram as mudanças influenciam o plano de comunicação, mas estes anos têm comprovado que alguns fatores são chave para assegurar que as mudanças sejam implementadas com mais efetividade e, quando possível, com menos impacto.

Transparência é um dos principais, senão o principal fator de sucesso. Parece clichê, mas não é. Processo de mudança naturalmente causa ansiedade, dúvida e desconforto. Por isso, clareza e consistência devem permear o planejamento, a execução e a mensuração da comunicação.

É preciso dizer sempre a verdade: falar com sinceridade sobre fatos e ações de curto, médio e longo prazos, ou simplesmente, quando não houver resposta precisa, é necessário dizer claramente que ainda não existe uma posição formal sobre o assunto.

Evitar omissão é fundamental. As pessoas são sensíveis e captam facilmente no clima organizacional quando algo não vai bem. Esconder os fatos é o primeiro passo para que a “rádio-corredor” entre em cena. As pessoas começam a fantasiar e cria-se o boato. Ou seja, “onde há fato, não há boato”.

Ter um plano de comunicação interna bem estruturado também é essencial. O plano deve abranger ações que tratem todas as etapas da curva da mudança, desde o momento em que o colaborador é informado sobre a mesma até a etapa em que ele a aceita. Existem diversas teorias em change management sobre as características de cada fase da curva. Independente do modelo de change management selecionado para moldar o plano de comunicação interna, talvez o maior desafio seja assegurar a flexibilidade deste plano.

Na prática, isso significa que o plano de comunicação deve ser dinâmico, refletindo o que está acontecendo no ambiente. Ou seja, é preciso mapear os efeitos da mudança no clima organizacional e, com base nisso, retroalimentar o plano. Para isso, é mais fundamental do que nunca ter uma parceria muito estreita com os gestores e com a área de RH que subsidiarão a comunicação com fatos e percepções que poderão influenciar as ações e mensagens da comunicação interna.

Nesse sentido, a pesquisa qualitativa também é uma ferramenta eficiente. Mapear a percepção dos colaboradores quanto à mudança que está sendo implementada, bem como o clima organizacional gerado a partir disso, ajudam a nortear as táticas de comunicação interna de maneira sintomática.

Um outro desafio importante: promover comunicação baseada em uma via de mão dupla. Ao invés de apenas informar ao colaborador “como, por quê, quando” as mudanças acontecerão, é essencial criar situações em que o funcionário possa ser ouvido e possa, também, contribuir para os planos da empresa rumo à mudança. As mídias sociais internas são ferramentas positivas neste sentido, pois fomentam discussões colaborativas que podem contribuir para o momento de mudança, gerar ideias, sugestões, esclarecer dúvidas, entre outros benefícios.

Porém, atenção: é preciso assegurar que a cultura organizacional, a audiência interna e a maturidade da comunicação interna favoreçam a implementação desse tipo de ferramenta. É preciso analisar com cuidado estes e outros fatores antes de apostar nas mídias sociais internas num contexto de mudança. Caso contrário, o efeito pode ser oposto ao desejado.

As lideranças e suas competências em comunicação são também decisivos num processo de change management. O papel dos gestores é de comunicar a mudança às suas equipes de maneira a contextualizá-la e customizá-la – de acordo com o repertório das equipes – e, ainda, deixar claro o que se espera dos colaboradores diante do cenário em questão. É o gestor que estabelece essa conexão com clareza e propriedade. Por isso, neste cenário, desenvolver ou potencializar as habilidades de comunicação dos gestores é mandatório.

E só falar, não é suficiente. O “walk the talk” é o que faz a diferença. O gestor deve falar sobre a mudança, e, mais do que isso: agir, performar e dar exemplos que estejam alinhados ao contexto vivido. É preciso inspirar as equipes e, com naturalidade, transformar o colaborador num embaixador da mudança.

Por fim, mas não menos importante: a área de comunicação interna deve atuar como agente da mudança. Circulando em todos os níveis e fluxos; ascendentes, descendentes, transversais, enfim! Entre todos, o elo mais estreito da comunicação interna deve ser com a área responsável pela mudança – via de regra a alta gestão – que deve estar apta a subsidiar a área de comunicação com suas expectativas, informações consistentes e transparentes. Além disso, deve estar preparada para ouvir o que a área de comunicação tem a dizer sobre o clima organizacional, sobre as pesquisas de percepção, sobre o que está em pauta na “rádio-corredor”.

Numa das mudanças organizacionais que vivenciei recentemente, ouvi de um consultor de change management uma expressão muito interessante. Ele disse: “Não se pode matar o mensageiro!”. Ou seja, num processo como este, a comunicação interna é agente, é interlocutor, é “mensageiro” e deve atuar com autonomia, espaço e credibilidade necessários para garantir a execução de ações consistentes, por meio de um plano de comunicação dinâmico, que reflita intimamente o “tom” da mudança.

Escrevi esse conteúdo em 2010, especialmente para um curso no IQPC. Foi divulgado no site do IQPC, no blog http://comunicacaocomfuncionario.blogspot.com/ , entre outros.

domingo, 1 de maio de 2011

Uma breve reflexão sobre a posição da Comunicação Interna no organograma das empresas e seu impacto na autonomia da área

 
Esses dias - bem informalmente – publiquei no meu perfil do twitter uma visão que tenho sobre a configuração organizacional da área de CI nas empresas. Ou seja, onde a área de CI pode estar inserida dentro do organograma das corporações e como isso impactaria a autonomia e legitimidade da área. Este ponto de vista gerou uma troca de ideia produtiva com alguns colegas do mercado.

Porém, antes de compartilhar minha reflexão, acho importante registrar que não entendo que essa minha visão empírica, ou seja, adquirida no dia a dia, necessariamente reflita e/ou se aplique - de maneira generalizada ou absoluta - à realidade das estruturas de CI existentes no mercado organizacional afora. É uma opinião que reflete apenas a minha experiência profissional.

De partida, penso que essa minha visão pode gerar controvérsias, pois ela abre precedentes para ser interpretada como um não-estímulo à institucionalização da área de comunicação interna como estrutura independente das demais. Quero reforçar que não é essa minha intenção. Pelo contrário: sou adepta a qualquer movimento que possa fortalecer a área estrutural ou politicamente no contexto organizacional.

Por último, e não menos importante: minha visão não é estática. Mas como reflete minha vivência – e o aprendizado que extraí dela – lhe atribuo bastante significado. Porém, minha percepção definitivamente não está acima da minha disponibilidade para mudar de opinião a partir de dados que evidenciem a hipótese de que a área de CI ao ser independente organizacionalmente terá, de fato, mais autonomia.

Toda reflexão tem sua origem na minha vivência profissional: já trabalhei em uma empresa onde CI estava inserida em Marketing. Numa outra, a área estava dentro do RH. E na última, a área era independente. Tendo como referência o que vivenciei nestas empresas, meu argumento central é: a posição de CI no organograma é apenas um dos elementos que impactam a autonomia, legitimidade e visão estratégica da área.

Ou seja, talvez a vinculação estrutural de CI tenha um grau de relevância bem relativo dentre os demais fatores a seguir, que, por sua vez, tendem a contribuir significativamente para a autonomia da área:

1. Área de CI reconhecida como influenciadora da cultura organizacional: A partir do momento em que CI é integrada e percebida como área que influencia a construção/reposicionamento da cultura organizacional, a estrutura passa a obter mais relevância e, portanto, autonomia em sua atuação, e consequentemente legitimidade junto ao corpo diretivo da empresa.

2. Política clara junto aos “clientes internos” quanto às formas de trabalhar em CI: é importante ser transparente junto às áreas - os tais “clientes internos” – ao explicar as formas de trabalho, normas e processos da área àqueles que geram a demanda. Ou seja, explicitar de forma aberta e objetiva como a gestão de CI prioriza, endereça, trata e entrega as demandas ajuda os clientes internos a compreenderem a dinâmica e a velocidade da área e, assim, minimiza a função, e percepção, da área como “atendedora da pedidos”, atribuindo a ela um caráter mais estratégico e, também, autônomo. É uma tática fundamental para assegurar o respeito das demais áreas à área de CI.

3. Liderança engajada que legitime a área: na medida em que as lideranças e, principalmente, a presidência, respeitam a área de CI e compreendem sua relevância estratégica e relacional, maior será a autonomia e alcance da área para:
- lidar com temas sensíveis ao negócio e, assim, potencializar sua atuação estratégica; - contar com o apoio das lideranças na disseminação de mensagens e relacionamento com as equipes;
- obter validação e apoio do corpo diretivo na definição da agenda de prioridades a serem tratadas por CI em detrimento das solicitações das demais áreas - às vezes não tão relevantes sob o ponto de vista que contemple a organização como um todo.

4. Um forte time de comunicação para área de CI que seja tecnicamente e gerencialmente preparado e que defenda seu espaço de atuação apropriado de senso de prioridade, capacidade de articulação e visão estratégica. A habilidade de atuar com diplomacia e ampliar sua visão para a totalidade, o ajudará a negociar prioridades junto às áreas-clientes, independente de onde CI estiver inserida. Esse fator também contribuirá para legitimar a área e aumentar seu grau de autonomia.

5. Configuração da área no organograma: e, enfim, estar dentro do RH, do Marketing e ou ser uma área independente; cada uma dessas opções apresenta vantagens e desvantagens para CI:
- RH: Estar no RH pode demandar que os assuntos correlatos à área sejam mais pautados pela CI. Em contrapartida, essa configuração oferece a vantagem de aumentar a percepção da área de CI quanto aos fatores que impactam o clima organizacional e, assim, aumentar sua habilidade e repertório para tratar o tema;
- Marketing: Ao estar no Marketing, a área de CI pode ser acessada excessivamente a fim de promover campanhas de endomarketing. Por outro lado, a vantagem é que essa configuração possibilita uma forma mais integrada de trabalho às duas áreas, facilitando a sincronização e alinhamento na divulgação de notícias interna e externamente, bem como a formação de funcionários que sejam porta-vozes da marca interna e externamente;
- No modelo organizacional em que CI é área independente, existe, supostamente, uma neutralidade maior em relação à definição de prioridades da área, e, portanto, uma sensação de maior autonomia, mas isso dependerá do tipo de relação que área estabelecer com seus clientes internos. Ou seja, a área pode ser independente organizacionalmente, mas, sem os demais aspectos, será que consegue assegurar sua autonomia? Ser organizacionalmente independente, exclusivamente, confere visão estratégica à área?

Os pontos de 1 a 4 acima abordados independem de onde CI está inserida organizacionalmente. Acontecem naturalmente e possuem alto impacto no grau de autonomia da área. Já o aspecto número 5 dependerá da forma como CI se relacionará com as áreas de negócio e não é garantia, isoladamente, de autonomia para CI.

Por isso, acredito que a configuração organizacional, por si só, não seja um fator determinante para possibilitar autonomia e assegurar visão estratégica para CI. Defendo a conclusão empírica que, seja no RH, no Marketing, ou numa área independente, o que faz a diferença é o conjunto dos fatores acima citados que contribuem para legitimar a área de CI em toda sua relevância e necessidade de autonomia. E você, o que acha? Compartilhe!

Dedico esse post ao querido colega e RP Rodrigo Cogo que sempre estimula reflexões inspiradoras e produtivas!

terça-feira, 5 de abril de 2011

Comunicação interna informal: fonte de inspiração ou mecanismo de controle?


Um dos temas que mais me mobiliza no ambiente organizacional é o fenômeno da comunicação interna informal. Como falei anteriormente, em um dos meus posts aqui no blog, de todos os desafios da comunicação interna, talvez este seja o que mais me instiga.
A comunicação interna informal é constituída por tudo aquilo que não é produzido com intencionalidade pela área de comunicação interna institucionalizada. São os boatos, as conversas de corredor, os rumores, as redes de relacionamento, a articulação dos líderes informais, etc. “O estudo dessa rede passa por uma detalhada prospecção sobre sua natureza e extensão, que localizará pontos de tensão, grupos de influência, áreas de atrito, velocidade e agilidade da informação” (TORQUATO, 2002).
Quero registrar ainda que a comunicação interna informal é um tema amplo, caracterizado por diversos aspectos. Esse post não tem como objetivo abarcar todas estas peculiaridades, nem defender argumentos teóricos atrelados ao conceito em si e, sim, apenas estimular uma reflexão breve quanto a alguns dos aspectos que compõem a comunicação interna informal e que a qualificam como tão orgânica e autônoma.
As redes informais de relacionamento: profissionalmente, pude acompanhar o quanto as redes de relacionamento do ambiente organizacional têm força, principalmente em momentos de crise e mudança. E não estou falando das redes virtuais, estou falando das reais, das redes de relacionamento entre indivíduos, que se formam em todas as direções e fluxos. Em situações de crise ou mudança, nas quais as organizações também estão se posicionando frente a um novo desafio, é normal a busca pelas relações de confiança como referência para se encontrar respostas, explicações ou simplesmente trocar impressões sobre as ameaças imaginárias ou vigentes, como por exemplo, possíveis demissões, mudanças organizacionais, adoção de novas tecnologias, etc.
Neste sentido, os indivíduos se agregam diante de um sentimento de ansiedade ou insegurança que lhes é comum. É curioso observar como essas redes sempre se aglutinam e se configuram a partir da interação entre indivíduos que interagem com base em diferentes elos de relacionamento: permeados por sentimentos de amizade, coleguismo, empatia, bem como pautados por interesses adjacentes, tais como busca por poder, prática da politicagem, manutenção ou busca por alianças, entre outros.
Pela força própria que esse fenômeno tem, acredito que a área de comunicação interna, ao invés de adotar qualquer movimento no sentido de tentar neutralizar estas redes, deva, sim, estudar sua configuração, entender a natureza e aspectos que envolvem sua formação, compreender quem são os formadores de opinião que potencializam estas redes e, assim, buscar maneiras de interagir neste contexto, de modo a legitimar ainda mais a comunicação interna formal e o discurso organizacional, pois “(...) em algum momento, a rede informal trabalhará no sentido positivo” (TORQUATO, 2002).
O fenômeno da rádio corredor em toda sua complexidade: minha impressão é que a rádio corredor coloca em circulação a massa crítica de informações resultante do processo de comunicação informal via redes de relacionamento. Ela existe, sempre existiu e acredito que continuará existindo.
Criar e buscar explicações paralelas, além das oficiais, é um aspecto humano que tem seu viés enraizado na base das teorias que explicam o fenômeno dos boatos e rumores, por exemplo. Os boatos surgem “a partir de uma tentativa de se lidar com o lado emocional de uma situação e, assim, buscar neutralizar alguma ameaça psicológica inerente ao tema em evidência, principalmente em situações de conflito e crise” (DIFONZO, 2009).
Se eles devem ser monitorados? Sim, considero importante buscar táticas de escuta da conversação do público interno, até mesmo com a finalidade de entender a origem e esclarecer os boatos - fornecendo as informações oficiais necessárias para amenizar a ansiedade dos envolvidos - bem como trabalhar junto aos líderes para que eles possam disseminar as mensagens formais e, ainda, buscar elementos que ampliem a nossa compreensão acerca das conversas de corredor.
Uma estratégia, também, é se antecipar aos rumores, informando o funcionário em primeira mão e, assim, procurar minimizar a disseminação de informações inconsistentes e especulativas. Mas evitar completamente a rádio corredor, acredito que seja improvável. Outra alternativa a se considerar: definitivamente, encarar a rádio corredor como aspecto inerente ao processo comunicacional. Essa conduta pode contribuir para o planejamento de ações que tratem os ruídos de maneira preventiva ou, quando necessário, reativa.
Por último, quero compartilhar uma reflexão: o quanto que as mídias sociais internas (blogs, wikis, twitters internos etc.) tornam tangível o que já se passa na comunicação interna informal? Como o uso das mídias sociais na comunicação interna é algo muito recente, temos pouquíssimos elementos práticos e teóricos para uma avaliação consistente. Mas penso que o que se passa na comunicação interna informal possa ser tratado na esfera virtual, tendo as mídias sociais internas como fator facilitador.
Explico: a partir de plataformas online de comunicação interna que favoreçam a comunicação deliberativa, uma cultura organizacional que estimule o espaço genuíno para a troca de ideias, bem como lideranças preparadas para interagir neste ambiente, talvez seja possível trazer para o ambiente virtual as discussões pautadas na comunicação interna informal - invisíveis aos olhos da alta direção. O ambiente virtual, por algumas de suas características próprias - informalidade, minimização da hierarquia e possibilidade de falar e ser ouvido em tempo real - pode facilitar a discussão de ideias e promover um espaço para troca de opiniões.
Acredito que apenas a partir da observação do uso das mídias na comunicação interna será possível confirmar se a dinâmica da interação online, somada a outros fatores do ambiente interno, será suficiente para fazer prevalecer o tom e fluidez da comunicação informal visando facilitar uma comunicação legitimamente conversacional e deliberativa na esfera organizacional.
Concluindo, considero que a comunicação interna - enquanto área no contexto organizacional - não tem e não terá controle sobre os impactos da comunicação interna informal e seus desdobramentos, mas, sim, poderá buscar entendimento e inspiração na comunicação informal, enquanto fenômeno social, a fim de constituir relações e diálogos permeados pelas mensagens organizacionais, favorecendo um contexto onde os funcionários possam expressar sua percepção e sentimentos em relação ao ambiente organizacional no qual estão inseridos.
Ainda, sob a perspectiva da comunicação informal, dá para imaginar que o conceito de emissor e receptor – em sua essência linear - parece ficar ultrapassado: o colaborador não apenas recebe a informação, mas passa a ser, também, emissor dela - produzindo, reproduzindo e influenciando as mensagens que circulam. Daí a importância de compreender que o colaborador se torna um agente da comunicação interna, um porta-voz da organização.
E, para isso, é preciso efetivamente dar voz ao funcionário, é necessário deixar emergir os conflitos, insatisfações, percepções, e tratar esses temas com a naturalidade e a transparência inerentes à uma esfera organizacional que se articula com o objetivo de se fazer compreender, respeitar e relacionar mutuamente: um movimento do funcionário para com a empresa e da empresa para com o funcionário, em busca de uma comunicação que assegure satisfação para as duas partes envolvidas.
Diante do cenário aqui compartilhado, o desafio que temos - enquanto comunicadores internos – é o de exercitar, cada vez mais, algumas de nossas habilidades em desenvolvimento: sublimar a busca pelo controle das mensagens e seus meios, abandonar os paradigmas informacionais e, finalmente, ir a campo; aplicando a teoria, observando a prática e compartilhando os resultados analisados.
Espero que este blog possa ser ferramenta para este exercício de troca! Comentários são mais do que bem-vindos sempre.
Abraços! Cynthia
DIFONZO, Nicholas. O poder dos boatos: como rumores se espalham, ditam comportamentos, podem ser administrados e por que acreditamos neles. Rio de Janeiro, Editora Elsevier, 2009.
REGO, Gaudêncio Torquato do. Comunicação Interna: os desafios da integração Originalmente publicado no site Mega Brasil Comunicação, disponível em: <http://www.portal-rp.com.br/ bibliotecavirtual/relacoespublicas/funcoesetecnicas/0128.htm> Acesso em 2002.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Os benefícios da interdisciplinaridade na construção de um olhar próprio para a Comunicação


Sempre fui admiradora das intersecções entre a Comunicação Organizacional e outros campos da ciência, tais como sociologia, antropologia, psicologia e semiótica. Entendo como bastante enriquecedor estabelecer conexões entre estas disciplinas e os temas intrínsecos à área de comunicação interna e cultura organizacional, por exemplo.

Neste sentido, penso que, enquanto pesquisadores de Comunicação, somos privilegiados, uma vez que essa abertura aos outros campos teóricos existe desde a origem da área, e o resultado disso tem sido a obtenção de aporte e contribuições das demais esferas científicas à área, e, com isso, o desenvolvimento da nossa capacidade de lançar um olhar ainda mais reflexivo sobre as inquietações e objetos de estudos da Comunicação.

Ou seja, essa natureza interdisciplinar - que busca o entrecruzamento de diferentes contribuições científicas - é uma tradição da área que, desde sua origem, foi profundamente influenciada por diversas correntes de teorias da Comunicação que tiveram seu embasamento nos campos da semiologia, antropologia, psicologia, etc.

Além deste seu aspecto histórico, a interdisciplinaridade, também se configura como uma tendência na medida em que reflete e reforça os debates híbridos da atualidade que, como observa a autora Vera França*, favorecem o “espírito da nossa época que chama aos transbordamentos, à mistura e estimula a diluição dos feudos, das demarcações rígidas de terreno”.

A autora - que inspirou a reflexão em questão – também contrapõe a ideia de que o “rótulo da interdisciplinaridade estaria resultando na falta de especificidade da Comunicação, enquanto objeto de estudo”. Assim, ela provoca:

“O lugar da comunicação apresenta um olhar próprio? Uma outra compreensão, uma nova contribuição que vai se somar às demais? Ou nós, pesquisadores da comunicação, apenas recolhemos e repetimos as análises feitas nas outras áreas?”

Neste mesmo contexto, a própria autora legitima a Comunicação como um “lugar de conhecimento” que cultiva um viés, um olhar próprio cuja especificidade se propõe a alcançar a interseção de três dinâmicas básicas:
- o quadro relacional (relação dos interlocutores) que pode, eventualmente, ser inspirado pelo olhar sociológico;
- a produção de sentidos (as práticas discursivas) que pode, eventualmente, ser entendido por meio da linguística;
- a situação sócio-cultural (o contexto) que pode, eventualmente, ser entendida pelo olhar antropológico;

A Comunicação, ao desenvolver este viés que dialoga com todas as perspectivas, tem condições de assegurar um olhar especializado, inerente à nossa natureza teórica e prática, que possibilita “um lugar frutífero para analisar e compreender a realidade em que vivemos” e, ao mesmo tempo, estimula “um processo comunicativo de algo vivo, dinâmico, instituidor de sentidos e de relações; lugar não apenas onde os sujeitos dizem, mas também assumem papéis e se constroem socialmente; espaço de realização e renovação da cultura”.

Na minha visão, todas as contribuições de outras áreas da Ciência são valiosas e nosso caráter interdisciplinar deve ser mantido e estimulado, não apenas por que reflete uma tendência contemporânea da ciência de buscar confluências entre diversas áreas do conhecimento. Mas também porque essa característica interdisciplinar, ao contrário do que se possa questionar, não nos delimita enquanto Ciência, e, sim, possibilita o desenvolvimento deste olhar especializado, próprio.

Ao buscar a especificidade deste olhar da comunicação, mais amplo e dialógico - e que considera as três dinâmicas básicas mencionadas anteriormente - teremos condições de quebrar, cada vez mais, o paradigma informacional de comunicação, praticamente hegemônico, cuja abordagem simplista e simplificadora caracterizam um modelo mecanicista de transmissão de mensagens.

Com este olhar mais consolidado e paradigmas quebrados, será possível experimentar com mais confiança, a prática de modelos de comunicação dialógicos e deliberativos como, por exemplo, o que dissertei no último post.

Esta prática, certamente, favorecerá espaço e condições para que, empiricamente, possamos experimentar e analisar os novos modelos de comunicação, bem como seus resultados e evidências, e, a partir deles, produzir conclusões que possam compor e inspirar a conceituação epistemológica da Comunicação, corroborando nossa autonomia e relevância enquanto Ciência que possui um olhar próprio e que gera contribuições singulares.

Fonte: FRANÇA, V – “Paradigmas da Comunicação: conhecer o que?”. Trabalho apresentado no 9º encontro anual da COMPÓS. UnB, DF, 6 a 9 de junho de 2001.

terça-feira, 1 de março de 2011

Comunicação via humanização: Um risco ou uma necessidade?

Sempre fui um pouco cética no que diz respeito às reflexões amplamente teóricas que não me pareciam aplicáveis à realidade organizacional. Até que tive a oportunidade de conhecer as reflexões críticas sobre comunicação e humanização nas organizações de Dennis Mumby, um dos mais respeitados estudiosos e pesquisadores da Comunicação Organizacional no mundo.

Em sua teoria crítica, o autor abre perspectivas sobre como a comunicação via humanização estabelece um diálogo entre os interlocutores que dinamiza as relações, por meio da interatividade, possibilitando espaço para deliberação e negociação entre os agentes da comunicação e assegurando que sentidos seja construídos em conjunto.

Este conceito de comunicação que, na minha visão, está ainda na teoria e não permeou a prática, desestabilizaria as práticas de poder e resistência por parte das organizações. Explico: quando conceitos são divulgados, numa abordagem da alta direção às demais camadas da organização, por meio da comunicação interna, significados são construídos a partir de relações de poder e de perspectivas concebidas pelas lideranças. As mensagens disseminadas pela comunicação organizacional têm sua origem neste contexto e refletem a ambição das corporações de fazer com que os funcionários internalizem a visão de mundo e estratégia da organização.

Assumimos, então, que a comunicação via humanização, por sua vez, está orientada para uma abordagem relacional, onde buscamos um diálogo não “por que nos simpatizamos uns com os outros, mas por que damos atenção às diferenças que desafiam nossa compreensão do senso comum de como o mundo funciona”. A partir dessa premissa, compartilho da visão do autor sobre o quanto essas interações colaborativas desafiam as posições de poder vigente possibilitando que “aquilo que é dado como certo seja reformulado à luz das diferenças entre os interlocutores”.

Partindo para um contexto mais específico, proponho a seguinte reflexão: será que não é o risco de desestabilizar o “status quo” que incomoda as organizações quando do uso das mídias sociais na comunicação interna? A dinâmica do uso das mídias sociais propõe uma comunicação essencialmente humanizada, pois é instável, incerta, reproduzida a partir do discurso de seus membros e, por isso, fragilizaria o poder nas organizações na medida em que permite:

a)      acesso ao poder de decisão: possibilidade de falar e ser ouvido em tempo real
b)      poder para influenciar pessoas, processos e seus resultados
c)      acesso à informação e análise adequada de seu conteúdo (lembrando que, para muitos, informação ainda é poder...)
d)     intensifica o processo aberto de deliberação e tomada de decisão

E será que não é isso que as organizações precisam e, ao mesmo tempo, temem? A possibilidade de deliberação e diálogo já se reflete em outras instâncias da vida do funcionário, na medida em que ele pode exercer sua influência como cidadão e consumidor, por exemplo. Por que não em seu ambiente de trabalho?

Será que não é pertinente que as organizações percebam seus funcionários como seres complexos que podem contribuir, colaborar, deliberar sem que isso represente uma ameaça ao que é vigente?

Para complementar, gosto da ideia que o autor apresenta de estabelecer, em linha com estes desafios, uma comunicação compassiva: notar, sentir, responder. Ou seja, se abrir ao que acontece ao seu redor, reconhecer as necessidades dos funcionários e agir a fim de fomentar a reciprocidade.

Na era da deliberação e diálogo aberto como a que vivenciamos, já não é possível moldar a ideia das pessoas em linha com a realidade organizacional. Os funcionários têm experiências e relacionamentos únicos e próprios que não são necessariamente permeados e/ou mediados pela lógica corporativa. E ao se comunicar de forma deliberativa e relacional, as organizações têm a oportunidade ímpar de “considerar o outro não como alguém que precisa ser incorporado à sua visão de mundo, mas sim como alguém diferente”.

Alguém que “apresenta um horizonte de possibilidades diferente do nosso e que representa um risco para nós, por que se engajar ao seu horizonte nos abre a possibilidade de mudança e transformação”.

Mudança e transformação. Não é disso que precisamos?!

MUMBY, Denis. Reflexões críticas sobre comunicação nas organizações. In: Kunsch (org). A comunicação como fator de humanização das organizações. São Paulo: Difusão, 2010, p. 19 – 39.